sábado, 31 de janeiro de 2009

A Vida Responsável

...
e cortar as unhas às minhas filhas.
Madrugar outra vez e ter cuidado
em não dizer incomveniências,
esmerar-me na prosa de umas folhas
e estou-me nas tintas para elas,
retocar de vermelho cada face.
Lembrar-meda consulta ao pediatra,
responder ao correio,estender roupa,
declarar rendimentos, ler uns livros,
fazer umas chamadas telefónicas.
Bem gostaria de me dar ao luxo
de ter o tempo todo que quisesse
para fazer só coisas esquisitas,
coisas desnecessárias, prescindíveis
e, sobretudo, inúteis e patetas.
Por exemplo, amar-te com loucura.

Amália Bautista, Trípticos Espanhóis

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Clezio

Faz-se luz......

Faz-se luz pelo processo
de eliminação de sombras
Ora as sombras existem
as sombras têm exaustiva vida própria
não dum e doutro lado da luz mas no próprio seio dela
intensamente amantes loucamente amadas
e espalham pelo chão braços de luz cinzenta
que se introduzem pelo bico nos olhos do homem

Por outro lado a sombra dita a luz
não ilumina realmente os objectos
os objectos vivem às escuras
numa perpétua aurora surrealista
com a qual não podemos contactar
senão como amantes
de olhos fechados
e lãmpadas nos dedos e na boca

Mário Cesariny, in "Pena Capital"

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

João Aguardela

A Vida é tão curta............ e preocupamo-nos com coisas tão fúteis e tão estúpidas....amigo....vou brincar com a vida cada vez mais..... e sorrir....

domingo, 18 de janeiro de 2009

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Intensidades

Cessam em ferida as nossas bocas
as nossas bocas evaporadas luzem
arrastando os despojos do amor
descarnado na névoa do tule
da tarde teu corpo como um
deserto treme pensativo agreste

profanação de sombras seculares
onde desabrido geme inútil
o meu corpo ignorado
cujos olhos sepultam flores silvestres
no vasto caminho da alma dos outros...

o vento sublime pelas nossas
bocas evaporadas vai subindo
graciosa carícia de água
que adormece o consolo

somos felizes somos loucos!
onde ondeia a força que nos separa?
no compasso astral!

canto agora ensandecido a tua boca
regato do meu ser bem firme
sopro húmido da aurora
é deus o novo outrora
que perfuma a lama da eternidade
ilusão da maré destas bocas revoltadas
exaustas que arrebatam o pecado

nunca amaram as bocas geladas
que se afastam evaporadas no
ocaso primaveril da luz do teu peito
redondo onde antes entrara
escuro o último raio de sol

quando mortas repetirem este gesto
as nossas bocas na lonjura
intemporal gigante encostadas
às rochas da fome terna onde
aprendemos a sentir a extensão
diluída do que fomos


os lábios que te peço lembram
o arder do fogo que curioso
adormece na vigília da noite
com a amarga ânsia roubada
aos beijos inextinguíveis
das bocas de néctar evaporadas

Henrique Levy
INTENSIDADES
Euroexpress
colecção o sol no tecto
2001

terça-feira, 13 de janeiro de 2009


Ilustrações Ana Biscaia

O Operário em Construção

De repente do riso fêz-se o pranto
silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fêz-se espuma
E das mãos espalmadas fêz-se o espanto.

De repente da calma fêz-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fêz-se o pressentimento
E do momento imóvel fêz-se o drama.

De repente, não mais que de repente
Fêz-se de triste o que se fêz amante
E de sózinho o que se fêz contente.

Fêz-se do amigo próximo o distante
Fêz-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.

Vinicius de Moraes, in" O Operário em Construção"

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

A Nossa Vida

Vamos ser crianças outra vez, preservar a inocência dentro de nós e apesar dos desvios sorrir para a vida que, ela vai sorrir para nós!
Apesar do sofrimento existir, e por vezes a vida não ser uma recta de Felicidade, vamos olhar para as coisas simples com um sorriso!
Por vezes, a vida tem certos atalhos que nos lançam num sofrimento atroz!
A idade mostra-nos outro olhar sobre as coisas.

Por vezes sentimo-nos pequeninos e inocentes num mundo tão grande.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

domingo, 4 de janeiro de 2009

Bosque da Noruega

O Virgem Negra

Põe-me as mãos no sexo,
Beija-me na coxa,
Abre-me no plexo,
Uma ferida roxa.

Eu não sei porquê,
Meu dês d'onde venho,
Sou o ser que vê
Só seu tamanho.

Põe a tua mão
Num laço sem fim,
E chega ao desvão,
Abre-o para mim.

...

É importante foder (ou não foder)?
É evidente que não, não é importante.
Fode quem fode e não fode quem não quer.
Com isso ninguém tem nada
Mas mesmo nada
A ver.

O que um tanto me tolhe é não poder confiar
Numa coisa que estica e depois encolhe,
Uma coisa que é mole e se pôe a endurar e
A dilatar a dilatar
Até não se poder nem deixar nada
Para depois se sumir
E dar vontade de rir e d'ir urinar.

Isso eu o quiz naquele verso louco que tenho ao pé:
"O amor é um sono que chega para o pouco ser que se é"
Verso que, como sempre, terá ficado por perceber ( por
mim até).

Dorme, filha, dorme,
Vaga em teu sorrir.
Sonho-te tão bem
Que o corpo me vem
E me venho sem ir

...

Pinar só co' a cabeça
É protérrima noção
Ca literatura começa
Ter muita aceitação.


Entada a tola entra tudo: taco
Tórax e veio.
Se não couber no buraco
Racha-te o bruaco ao meio.

-Nem rachar será preciso
Só rasgar um bocadinho
Como na árvore, inciso
O nome do passarinho

O Virgem Negra, Fernando Pessoa, explicação às criancinhas naturais e estrangeiras por M. C. V., Mário Césariny, Assirio &Alvim.